::O Blog::

Cinema, Televisão, Fotografia, Arte pictória e o que mais se pode ver!

::Sobre os autores::


  • Li Mendi é jornalista, tem 23 anos e pretende fazer faculdade de publicidade ano que vem. Nas horas vagas, escreve e-books e curte falar de arte. Uma gemeniana clássica: uma dentro da outra; por vezes, uma contra a outra.

  • Guilherme Zanella faz faculdade de cinema, tem 17 anos. Escreve o seriado cheio de mistérios Ponte Lusac. Adora cinema e artes.

    ::Selo::

    Copie o código


    ::Sites::

  • Ancine
  • Almanaque Virtual
  • Bonequinho
  • Cavideo
  • CineClube
  • Cinemascópio
  • Curta o Curta
  • Críticos.com
  • Contra Campo
  • Docblog
  • Jean Claude
  • IMDB
  • Ilustrada no Cinema
  • Porta Curtas
  • Revista Cinética

    ::Boa Leitura::

  • Blog do cinema
  • Blogueiros cinéfilos

  • Sobre Fotografia
  • Comodoro
  • Ele e Ela
  • Olhar panorâmico
  • Setaros
  • Liga dos blogs Cinematográficos
  • CineKinos
  • Imagem em movimento
  • CineMonamour

    ::Arquivo de Textos::

  • 08/10/2007
    Não posso mudar nada do que vi, mas o que vi me mudou


    Cartier-Bresson veio de uma família pequeno burguesa parisiense e dizia que iria ser pintor. Aos 17 anos, ganhou de presente uma câmera e começou a fotografar na fazenda do tio o cultivo da cana de açúcar. O que lhe inspirou o interesse pela fotografia foi a foto Meninos Negros à Beira do Lago Tanganica (1931), de Martin Munkacsi. O movimento das crianças correndo em direção à água sensibilizou Bresson para o poder da imagem fotográfica.

    É por suas fotos de gente comum que Bresson ficou mais conhecido, sejam elas do Harlem, do Texas ou da União Soviética, onde em 1954 ele foi um dos primeiros fotógrafos ocidentais com permissão para trabalhar. Cartier fez ensaios fotográficos sobre prostitutas e travestis no México, cobriu a guerra civil espanhola em 1936 e passou seis meses na China antes e depois da vitória comunista sobre o Kuomintang. Logo após foi para a Indonésia, onde conheceu sua primeira esposa, Ratna Mohini, e acompanhou as dificuldades do país para obter a independência em 1949.

    No filme Ponto de Interrogação Cartier-Bresson o fotógrafo aceita um bate-papo sobre as impressões de seu trabalho. Muito tímido, pede para que a luz de um dos refletores seja tirada de cima dele. “A penumbra é muito mais íntima”, explica. Essa intimidade presente entre a penumbra e a luz é tão bem representada nas fotos preto e branco de Bresson, que não fotografava em cor. Por mais que a cor seja uma representação que aparente uma reprodução mais natural, ela tenderia facilmente ao superficial e ao mecânico.

    “Tirar uma foto é como reconhecer um evento e naquele exato momento e numa fração de segundo, você organiza as formas que vê para expressar e dar sentido ao evento. É uma questão de pôr o cérebro, o olho e o coração na mesma linha de visão. É uma forma de viver". Assim, Bresson define seu método que é o de perseguir a foto “única”, aquela que é o clímax de eventos que poderiam ser dispostos numa parábola, em que no momento decisivo surgiria a foto síntese.Dessa maneira, o fotógrafo diferencia o desenho da foto, enquanto o primeiro é meditação, o segundo é o tiro.

    Para tirar proveito desse acaso, desse momento oportuno, Bresson tinha sempre pronta sua pequena câmera Leica e, como um “abatedor de carteiras”, como ele mesmo compara, rapidamente registrava o acontecimento, buscando a espontaneidade das pessoas, antes que estas se dessem conta de que iam ser fotografadas e assim não perdessem a sua naturalidade. Exatamente por isso ele buscava a discrição e tentava se passar desapercebido na multidão.

    Cartier não queria a foto anedota, mas a foto reportagem, por isso gostava que suas imagens estivessem em estreita ligação com o contexto dos fatos históricos em que foram tiradas. Essa prática tornou-se uma técnica profissionalizada na agência Magnum Photos, que ele criou junto com Robert Capa, em 1947. Na agência, os fotógrafos deviam, além de produzir o material fotográfico, se interar de tudo que estivesse ligado ao tema de seu trabalho e registrar suas impressões.

    Cartier Bresson também era um grande admirador do desenho. No Museu do Louvre passava longas horas copiando trabalhos de Géricault, Dürer e Goya. Contratou modelos nus, fez auto-retratos e desenhou a vista de seu apartamento de frente para o Jardim das Tulherias. Seus traços em preto e branco nos desenhos lembram a perseguição geométrica também presente em suas fotos, em que as formas e a luz estão sempre numa composição harmônica.

    Cartier não apenas fez trabalhos com a imagem estática na forma de fotografia ou desenho.No fim dos anos 30, Bresson trabalhou com cinema, como assistente de Jean Renoir nos filmes Um Dia no Campo e As Regras do Jogo, e fez dois documentários sobre os Republicanos na Guerra Civil Espanhola. Em agosto de 1944, Bresson retratou a libertação de Paris e no ano seguinte, dirigiu um documentário sobre prisioneiros de guerra retornando ao país.

    Bresson afirma que “entre encomenda e engajamento político não há diferença”, portanto, os filmes em que trabalhou levavam também seu apoio social e político. Sua relação estreita com a ideologia vinculada naquilo que produzia me faz lembrar o documentário “A deusa imperfeita” de Ray Muller, em que conta a trajetória da atriz e diretora Leni Riefenstahl. Nele, Leni declara que não teve qualquer influência na campanha propagandística de expansão do nazismo ao imprimir sua estética nos filmes “O Triunfo da Vontade” (1935) e “Olímpia” (1938). Como Bresson, que dizia se irritar quando o que via não estava na proporção correta, Leni também admirava a harmonia das formas geométricas, para ela o cinema se assemelhava à arquitetura e o princípio fundamental da criação de um filme deveria ser o equilíbrio. Baseada nesta idéia,organizou imagens das tropas dos alemães com um rigor simétrico que deixava imageticamente explícito os princípios de unidade, ordem e determinação do movimento nacional-socialista de Hitler. “OTriunfo da Vontade”, chamado de “Wood-stock fascista” pelo crítico Jack Kroll na revista Newsweek, para Leni foi apenas uma encomenda de Hitler e isso não significava que compartilhasse com o nazismo.

    O acervo de fotos de Cartier-Bresson foi organizado na
    Fundação Cartier-Bresson, na França, e sua arte tornou-se um objeto de celebração. O tímido Bresson, porém, não correu atrás da fama, pelo contrário, afirmou que ela é terrível, pois ficamos acorrentados a esta. Ele também deixou uma crítica aos meios de comunicação que estão repletos de comentaristas que tomam os eventos da vida privada alheia para explorá-lo de todas as maneiras, não deixando espaço para a imaginação, pois tudo é dito e explicado de forma sensacionalista. O fotógrafo dizia gostar do rádio justamente por este dar maior chance de imaginação ao ouvinte.

    Nas fotos de Bresson instigam a imaginação. Seu poder de captar a imagem síntese, que diz por si só, sem precisar de mais legendas, ou explicações, nos leva a profundas reflexões, uma vez que o trabalho geométrico e a sensibilidade com que as cenas são aprisionadas nos remetem a uma introspectividade. Quando vejo as suas mais simples fotos de pessoas de olhar perdido, sentadas em poltronas ou cadeiras, me pergunto; “o que elas pensavam?”, “Quais eram suas preocupações?”, “Quais eram suas dores?”. O fotógrafo conseguia captar um momento em que a pessoa se entregava à suas próprias reflexões e se esquecia da máquina. O resultado disso é uma foto que para mim funciona como um rádio, que me leva a imaginar as vozes mentais dessas pessoas silenciosas.

    Esse efeito de ressonância entre a imagem e a experiência de vida de cada um é o que Bresson mais valorizava quando dizia que a fotografia lhe atraia por esse poder de despertar o inconsciente. Pois o importante no retrato não era a expressão, para ele o mais interessante de se captar era justamente o silêncio.

    Cartier, que era um a admirador dos cientistas por estes não acreditarem em tudo e estarem sempre renovando suas teorias, dizia que o principal não eram as respostas, mas as perguntas e certamente isso fica impresso no seu trabalho. Ao observar uma de suas fotos em que um homem com uma perna só anda de muletas diante da ruína de uma construção, eu encontro uma resposta para o que é isso: uma pessoa que está tão destruído fisicamente como os próprios escombros do seu país. Mas também surgem muitas perguntas para o porquê disso: Por que o homem é capaz de destruir o seu igual?, Por que ele acha que a cor da pele ou a diferença de religião pode formar categorias do bem e do mal? Sucessivamente as inquietações vão surgindo a partir da imagem daquele aleijado.

    Cartier sabia que o visor de sua máquina tinha a capacidade de captar as pessoas nuas, não fisicamente, mas no seu íntimo psíquico e muito consciente disso, Bresson não gostava de ser fotografado. “Não gosto que façam comigo o que faço com os outros”, explicou. Sobre as imagens que vira em vida: na guerra, na sua estada num campo de concentração alemão por três anos, no cotidiano em meio ao cidadão comum e ou entre as pessoas famosas, Cartier
    afirmou: “Não posso mudar nada do que vi, mas que o que vi me mudou”.

    Fonte:
    Imagem

    Li Mendi